domingo, 12 de julho de 2015

“O JARDIM” – Um Inventário de Memórias pelos Labirintos do Tempo

O TEATRO QUE EU VI - TEXTO ESCRITO EM 10/07/2015



Os efeitos do tempo e as lembranças armazenadas são sempre matérias primas de grande  capacidade dramática e a dramaturgia desde tempos idos se vale delas para produzir grandes obras. Esse fascinante universo é mais uma vez explorado na peça “O Jardim”, produção da Cia Hiato, em cartaz no Tusp (Rua Maria Antônia, 294).

A peça apresenta 3 tempos de uma casa e um jardim, contados simultaneamente e ao mesmo tempo em separado. Para tanto, a excelente concepção do diretor Leonardo Moreira mostra-se inventiva e é um dos trunfos da montagem, que o fabuloso grupo de atores  executa com extraordinário apuro técnico.  Falar mais sobre o feito seria correr o risco de tirar o efeito surpresa que encanta a platéia. Melhor ver!

Os três movimentos  da história são defendidos com muita competência pelo elenco. Todas as fases são interessantes e prendem a atenção do público. Numa das fases, um casal tenta colocar os pingos nos is de uma relação em crise logo após a compra de uma casa e seu majestoso jardim. Os atores Thiago Amaral e Fernanda Stefanski dão conta do denso embate.

Numa outra fase, talvez a melhor, duas filhas preparam o pai senil para levá-lo a um asilo. O encontro é pretexto para que um mundo de lembranças e ressentimentos venha à tona. Maria Amélia Farah (estupenda!) é a filha abnegada, numa atuação comovente, contida e sóbria. Seu contraponto é a irmã tresloucada, uma atriz que fez carreira na França, deliciosamente vivida por Luciana Paes. A mistureba de português e francês de suas falas, os devaneios nonsenses e suas súbitas pausas reflexivas são, no mínimo, impagáveis. Pivô do maravilhoso embate entre as irmãs, o velho pai, em seu doloroso silêncio, encontra em Edison Simão uma personificação absolutamente emocionante. Um trio para se aplaudir de pé!

No terceiro quadro, uma jovem mulher e sua fiel  ajudante estão desmontando uma velha casa desapropriada e fazendo um registro de suas memórias.  As ótimas Aline Filócomo e Paula Picarelli dão vida às duas personagens, alternando situações ora dramáticas, ora patéticas.

Uma profusão de caixas de variados tamanhos compõe o criativo cenário de Marisa Bentivegna. Tanto funcionam como paredes de um castelo de cartas que ameaça a todo instante desmoronar, como divisórias de tempos e histórias ou como escaninhos que escondem em seus interiores as memórias de um passado. São também os labirintos de um jardim e ao mesmo tempo os labirintos da alma. Ao se moverem, fazem aflorar, de suas entranhas, alegrias e dores, mágoas e ressentimentos, boas e más recordações e mostram, por fim, o efeito devastador do tempo em nossas vidas.


“O Jardim” com suas dolorosas cercas, pode não ser um prado de delícias, mas é um muito bem cuidado espetáculo, delicioso  em sua estupenda criação.  Belíssimo, enfim!

O Jardim - O devastador efeito do tempo no corpo e na alma

Thiago Amaral e Fernanda Stefanski em O Jardim - Denso embate de um casal em crise

Maria Amélia Farah e Edison Simão em O Jardim - atuações comoventes


Aline Filócomo e Paula Picarelli, ótimas em O Jardim

Thiago Amaral e Fernanda Stefanski em O Jardim

Thiago Amaral e Fernanda Stefanski em O Jardim 

Luciana Paes, Maria Amélia Farah e Edison Simão, deslumbrantes em O Jardim

Luciana Paes em O Jardim - atuação deliciosa!
Luciana Paes, Edison Simão e Maria Amélia Farah em O Jardim


Luciana Paes em O Jardim

fotos - divulgação - fotógrafos: Annelize Tozetto e Lígia Jardim

Nenhum comentário:

Postar um comentário